Eu não sou diferente... Os outros é que são muito iguais.

20080915

A Minha Aventura no País da Escola Inclusiva

Aflitivo.

Foi aflitivo dar a primeira aula na minha turma especial. Saí da sala com os olhos marejados, consegui contudo não chorar à frente dos colegas. Senti uma aflição, uma impotência e uma angústia brutais.

A turma é composta por oito alunos: 2 ouvem um pouco e conseguem falar com bastante dificuldade; 5 apenas produzem vocalizações e 1 é surdo profundo, o que significa que não produz nem ouve qualquer som, comunicando somente por Língua Gestual.

Pedi ajuda aos que ouvem um pouco para traduzirem para LG o que eu ía dizendo. A recepção por parte destes foi quase nula e, quando o não foi, fizeram-no de má-vontade. (Acho eu... se é que traduziram realmente o que eu disse...) Não gostaram nada da ideia de ser eles a traduzir para os colegas, tendo-se mesmo recusado a fazê-lo em certos momentos, e exigiram constantemente a presença de um intérprete. A existência de um intérprete de LG está prevista na lei, mas o M(in)istério da Educação ainda não colocou os técnicos. Segundo me disseram colegas, com a contenção de custos, provavelmente não haverá colocação sequer. Vai mas é de arregaçar as mangas e fazer pesquisa sobre como ensinar surdos-mudos...

Um dos que fala passou a aula a gritar "never" porque odeia Inglês. Quando digo gritar, é mesmo gritar. Os outros 5, os que vocalizam, também o fazem muito alto. Já percebi porque razão as salas são insonorizadas. É uma barulheira pegada. Mas há alunos interessados: dois dos que apenas vocalizam participaram imenso. Em "voz" muito alta. Não fui capaz de pedir-lhes para falarem mais baixo. Eles provavelmente não têm noção da amplitude dos sons que produzem.

O E, um dos que vocaliza, é muito participativo, mas não consegui entender o que ele tentava vocalizar. Pedi-lhe para repetir, várias vezes. O que se tornou cansativo, tanto para mim como para ele. E frustrante. Deve ter sido vastamente frustrante para ele. Tentar comunicar e eu não conseguir percebê-lo. E quanto mais ele tentava vocalizar, menos eu percebia; e quanto menos eu percebia, mais angustiada e aflita eu ficava, porque pensava o quão frustrante deveria estar a ser para ele... Um círculo vicioso.

E todos a "falar" ao mesmo tempo, pois não ouvem quando outro está a tentar falar. Falam uns por cima dos outros. E, simultaneamente, a conversar entre eles em LG. E eu sem perceber nada. O que seria que estavam a dizer? Sem perceber patavina, passava-me pela cabeça tudo e mais alguma coisa. O que seria que estavam a dizer de mim? E não paravam de conversar. E eu sem saber como lidar com eles. Mandá-los "calar"? Não sei se isso é pedagogicamente correcto. Nem isso, nem nada. Não sei qual a pedagogia adequada a adoptar. Não tenho qualquer formação para lidar com este tipo de deficiências.

E ainda nem comecei a falar em Inglês... Saí da aula de rastos. Fisica e psicologicamente. Foi a minha turma especial.

A minha turma especial é isso mesmo: especial.

3 comentários:

Maria Felgueiras disse...

E ainda me lamento eu das contrariedades com as quais me tenho deparado neste início de ano lectivo...

Irás sair-te lindamente.

Beijos

Prezado disse...

Parabéns pela coragem.

E preserverança

Vee disse...

Obrigada aos dois :S São uns queridos. Parece que, por esta altura, cada um de nós tem os seus próprios moinhos de vento. Devolvo as vossas palavras amigas.